terça-feira, 15 de abril de 2008

Caso Isabella virou novela doentia

O texto abaixo, produzido por Claudio Leal, foi retirado do Terra Magazine, do portal Terra, onde o antropólogo Roberto Albergaria da Universidade Federal da Bahia fala sobre o que vem fazendo a mídia nesse caso.
A morte da menina Isabella Nardoni, 5 anos, deu início a uma novela midiática à procura de desfecho. Em 29 de março, ela morreu após uma queda da janela do apartamento do pai, Alexandre, na Zona Norte de São Paulo. A polícia investiga a autoria do crime e tem como principais suspeitos o pai e a madrasta de Isabella, Anna Carolina.
Há indícios de que ela tenha sido assassinada. Esse é o enredo central. O resto, segundo o antropólogo Roberto Albergaria, é a construção de uma novela “trágica” e “doentia”.
Doutor em Antropologia pela Universidade de Paris VII e professor da Universidade Federal da Bahia, Albergaria critica os exageros da cobertura midiática e aponta uma abordagem “classista” e “racialista” do crime. “Porque é uma menina de classe média, bonitinha, e aí vem a estética”, afirma.
- Há um lado doentio, e quem alimenta essa doença, que se tornou uma epidemia como a dengue, é a própria mídia. Porque há um viés “comunicacionista” ao se alimentar de forma mórbida uma história trágica. E transformar essa história trágica numa novela, no mesmo estilo das novelas das grandes televisões: mexicana.
O surgimento de reviravoltas, vídeos da menina, sangue nas camisas, testemunhas surpreendentes (o garçom do bar em que a tia de Isabella estava no dia da morte), os parentes, os vizinhos (personagens fatais na obra de Nelson Rodrigues), compõem o painel da novela. Para Albergaria, a mídia transformou o crime “em metade da pauta da mídia durante semanas e semanas”.
- O caso da menina veio a calhar para a mídia porque junta todas essas determinações: o classismo, o racialismo, o infantilismo… E, sobretudo, o “comunicacionismo”, uma das coisas mais doentias que existe hoje. É você explorar algumas misérias, seletivamente, como forma de emocionar as multidões.
O antropólogo exerga outra distorção: ajudada pelo mistério, a novela em que se transformou o caso Isabella vale mais do que os fatos, e tira do debate público temas mais relevantes.
- A mídia é o grande filtro. O espaço ocupado por essa menina é o espaço retirado de coisas muito mais importantes para a vida coletiva. Mas isso é um fato emocionante. A emoção vale mais do que a razão. A novela, o enredo, vale mais do que o fato - analisa Albergaria.
Veja a entrevista na íntegra.

Nenhum comentário: